Nascido em Tomar em 1986, filho de Adelino Escudeiro e Teresa Escudeiro, Nuno Escudeiro estudou em Aveiro e decidiu emigrar em 2012, ano em que “a alma do país estava muito negra e em baixo”. Viveu na Finlândia, mas atualmente reside em Itália, sem vontade ainda de regressar a Portugal. Trabalhou em publicidade, nas áreas do teatro e da dança e é autor ainda do documentário “Moon Europa” (2016). O realizador tomarense Nuno Escudeiro foi premiado no Canadá e estreia em França o documentário “The Valley”, sobre a relação de forças entre civis e autoridades no apoio a migrantes na Europa. O filme foi premiado no festival de cinema Hot Docs, em Toronto, foi exibido em Paris, numa sessão na Ordem dos Advogados, e chega aos canais televisivos franceses do Senado e Arte. A partir de Paris, Nuno Escudeiro explicou que “The Valley” foi rodado na fronteira entre França e Itália, na região dos Alpes, onde as comunidades locais de Roya e Durance ajudaram migrantes que procuravam refúgio na Europa.
O filme segue um grupo de voluntários que presta assistência a migrantes sem documentos oficiais, contornando assim o sistema legal, num ato de desobediência civil que causou polémica em 2016. Nuno Escudeiro viu-se compelido a filmar e a testemunhar um de muitos casos de acolhimento de refugiados, num ato de “participação na História dos nossos tempos”, disse. “Precisamos de ter consciência da nossa História, de voltar a ter empatia e de mostrar humanidade. Esta é uma questão do nosso tempo. O medo é uma emoção normal, mas a verdade é que o número de refugiados que chega à Europa é baixo”, disse. E o realizador lamenta que ainda não haja “uma resposta séria e forte” por parte dos Estados europeus para a crescente legitimação dos discursos radicalizados.
“O Vale” de Nuno Escudeiro apresentado em Paris – aborda assim a crise migratória que assola a Europa. Junto à fronteira entre a Itália e a França, os migrantes correm perigo de vida. À procura de uma vida melhor, fogem de guerras, de perseguições políticas e da miséria. Esta é a realidade concreta e real dos habitantes dos Vales de Roya e de Durance, nos Alpes. O filme “O Vale” trata-se do mais recente filme do realizador português Nuno Escudeiro, que durante dois anos testemunhos de migrantes e da população local que se mobiliza para ajudar e receber os milhares de migrantes que por lá passam. O documentário apresenta comunidades francesas que tentam responder à urgência da crise humanitária atual. Ao longo de 75 minutos, o realizador português expõe os riscos que estas povoações correm ao tentar defender aquilo que consideram «direitos humanos essenciais».
Durante dois anos, Nuno Escudeiro acompanhou “a transformação de um ato humanitário que emergiu no dia-a-dia de pessoas que começaram a ajudar refugiados que chegavam pelo Vale, em consequência do fecho das fronteiras francesas”. O filme acompanha este ato humanitário, que “foi forçado a tornar-se político à medida que surgiam os primeiros ataques por parte do Estado, sob a forma de repressão”. Em 2018, 2275 pessoas morreram ao tentar chegar à Europa. A França atribuiu 46.700 estatutos de refugiados aos 122.000 pedidos de asilo. “Em teoria, qualquer refugiado que entra em França tem o direito de pedir asilo político. Esse direito estava a ser recusado e impôs-se a questão de como é que estas pessoas que começaram esta ação humanitária se viram obrigadas a ir mais longe e fazer recursos a tribunais para condenar ações do Estado”, explica. Na linha da frente está a crise dos refugiados nos vales de Roya e Durance, na fronteira franco-italiana, onde as comunidades tentam ajudar milhares de pessoas que procuram asilo político. “É uma situação que nunca esperei ver porque é algo totalmente anormal. Há uma decisão política que é tomada por motivações que não são muito claras e com tendência a motivar associações entre terrorismo e migrantes, associação esta que nunca deveria ter sido feita porque uma não tem nada a ver com a outra. É criado para comunicar medo”, descreve Nuno Escudeiro.
O realizador tomarense enfrentou inúmeras dificuldades durante o processo de filmagem, nomeadamente nas cenas em que se vê a polícia a deter pessoas que pedem asilo, como uma família de eritreus deportada para Itália. Nuno Escudeiro é também conduzido no documentário por Michel Rousseau, do movimento “Tous Migrants”, ao cemitério em Briançon para falar da morte de uma migrante que não conseguiu passar a fronteira. “Ele sentia-se extremamente responsável”, descreve o realizador. O “Vale” apresentado no festival canadiano Hot Docs, no qual Nuno Escudeiro recebeu o prémio de melhor realizador emergente. “Receber este prémio é enorme porque me sinto reconhecido no Canadá como realizador emergente e por ser reconhecido o meu ponto de vista sobre o filme. Ser reconhecido pela forma de tratar questões super complexas sobre uma questão que penso que é a questão europeia dos nossos tempo”, concluiu. “O Vale” é um desafio ao público para que não permaneça parado perante uma crise humanitária que não para de aumentar. ANTÓNIO FREITAS com Lusa