Um casal de Abrantes, José e Zélia Serrano, deslocaram-se a Tomar, no dia 1 de Junho, para que o cidadão fosse observado por uma Junta Médica no edifício que está situado na Rua de Infantaria 15, junto ao tribunal nabantino. José Serrano, que está incapacitado dos membros esquerdos e, por isso, obrigado a mover-se em cadeira de rodas, queixa-se da forma como foi atendido nesse dia e esta revolta já chegou aos órgãos de comunicação à escala nacional, nomeadamente à TVI, que, na tarde da última segunda-feira, através de considerações feitas pelo jornalista Joaquim Letria, apontou o dedo aos responsáveis dos Centros de Saúde do Médio Tejo. Entretanto a Hertz falou com Zélia Cristina. A esposa de José Serrano confirmou que o marido foi observado em plena via pública porque, referiu, o edifício em causa não tinha rampa de acesso: «Quando cheguei ao local verifiquei que não havia estacionamento para pessoas com dificuldades motoras e tive que procurar por local para estacionar junto ao Tribunal. A entrada do edifício tem um lancil elevado para quem está a puxar uma pessoa em cadeira de rodas, pessoa que pesa cerca de 85 quilos. Deparei-me, depois, na entrada do edifício com dois degraus e, na minha inocência, pensei que havia outra entrada. Quando abri a porta, já com o meu marido do lado de fora, deparo-me com mais degraus. Dirigi-me à secretaria e mandaram-me aguardar. Imediatamente a funcionária foi a outro gabinete e apareceram um senhor e uma senhora, suponho que médicos. Ambos desceram comigo e fizeram a Junta em cima do passeio. Fique incrédula».
Zélia Cristina lamentou, ainda, mais duas situações, uma das quais bastante constrangedora. José Serrano teve vontade de urinar e, refere a sua esposa, foi forçado a fazer essas necessidades em plena via pública. Ficou, também, o reparo em relação ao facto de aquele centro de saúde não estar munido de serviço multibanco: «Assim que a Junta terminou, os senhores disseram-me para eu ir ao edifício para me entregarem a declaração. Fui atrás deles e ainda demorou um pouco até me entregarem a declaração. Depois, quando fui para efectuar o pagamento dos cinquenta euros entreguei o cartão multibanco mas a funcionária disse-me que ali não havia esse serviço. Disse que não tinha aquele valor comigo e a senhora disse-me que ao fim da rua havia um multibanco… Mas o meu marido continuava em cima do passeio. Quando eu saí, então o meu marido disse-me que estava aflito e que necessitava de ir à casa de banho. Fui a correr até ao carro buscar um urinol e, encostados a uma parede, envergonhados, de tal forma que ele nem conseguia fazer essas necessidades. Ele estava muito constrangido. Foi muito doloroso para ambos. Depois lá fui levantar dinheiro. No momento em que ia embora estava um outro senhor a ser atendido na rua. Ou seja, não foi só o meu marido nessa situação».
«Cidadão não quis entrar no edifício» – A Hertz já obteve uma reacção de Maria dos Anjos Esperança, Delegada de Saúde, que garantiu que José Serrano teve oportunidade para entrar no edifício em causa… só que recusou. A profissional assegurou à nossa redacção que os funcionários do centro disponibilizaram uma rampa de acesso amovível que existe naquelas instalações. Maria dos Anjos Esperança deixou claro que os serviços não assistem pessoas na rua: «Temos uma rampa de madeira amovível que o senhor não quis usar. Não vemos qualquer utente na rua. Nunca aconteceu isso. Por vezes, para facilitarmos as pessoas com mobilidade reduzida, deslocamo-nos à ambulância ou ao automóvel. Na última Junta, fomos ao carro ver uma jovem que tinha sido amputada de um membro. Para não a estarem a tirar para uma cadeira, fomos vê-la e falar com ela. Foi a mesma coisa que fizemos com este senhor. É pena que este senhor tenha dado o alarido que deu perante esta situação, situação que foi como lhe estou a contar. O que se passou foi isto».
Maria dos Anjos Esperança aproveitou, também, para esclarecer o que é uma Junta Médica, ao mesmo tempo que reforçou que José Serrano não quis entrar no edifício e, por isso, teve que urinar na via pública: «Uma Junta Médica não é uma consulta médica, nem de diagnóstico, nem clínico, nem para pedir exames médicos… A pessoa quando chega a uma Junta já tem o respectivo processo todo estudado pelos membros da referida Junta. Tudo o que fazemos é para facilitar a vida das pessoas. O problema do senhor ter necessidade de urinar e não ter uma casa de banho na rua não é problema nosso. O senhor não quis entrar e nem usar a rampa que nós temos para dezenas de pessoas que vão em cadeira de rodas às Juntas Médicas. Compreendo que uma pessoa de cadeira de rodas sofre muitos incómodos ao se deslocar à Junta e nós queremos, apenas, facilitar este processo».
A propósito da peça que passou, na última segunda-feira, na TVI, ocasião em que o jornalista Joaquim Letria comentou o sucedido, não poupando nas palavras para criticar o Coordenador da Unidade de Saúde Pública, Maria dos Anjos Esperança disse que a senilidade atinge todas as pessoas: «Esta é uma prova de que a senilidade atinge todas as pessoas. É uma pena que as pessoas estejam assim e que ainda consigam ter lugar nas televisões para fazer comentários. Foi ofendida uma pessoa que tem dado provas de que é um bom médico de saúde pública. Não me refiro nem a mim e nem aos outros dois membros porque essa junta nem foi feita pelo coordenador. Estamos a falar de uma pessoa que já recebeu a Medalha de Ouro do Ministério da Saúde pelos serviços prestados. É uma pessoa que não é nenhuma “jota” como o outro senhor referiu, tem já uma idade respeitável, e representa Portugal na Organização Mundial de Saúde ao nível da saúde oral. Por isso, o único comentário que me merecem essas considerações é que a senilidade atingir qualquer pessoa».